Entrevista concedida a Revista Letra Magna, revista eletrônica de divulgação científica em língua Portuguesa, Linguística e Literatura.
Mario Perini, Professor da Universidade Federal de Minas Gerais - UFMG |
LetraMagna:
Professor Perini, em primeiro lugar, gostaríamos de ressaltar que estamos
honrados com sua entrevista, e o parabenizamos pelo lançamento da “Gramática do
Português Brasileiro”, obra que será, certamente, referência no meio acadêmico.
Para começar, gostaríamos que respondesse: quem é “Mário Perini”? Conte-nos um
pouco de sua trajetória acadêmica.
Perini: Sou formado em Letras (português e latim) pela
UFMG. Nos primeiros anos da minha carreira, fui professor do ensino médio e de
cursinhos pré-vestibulares. Logo depois de formado comecei a trabalhar em
universidade: primeiro na Faculdade de Filosofia de Formiga, MG, e a partir de
1968 na UFMG, onde fiquei até 1999, com um intervalo de um ano (1978) em que
trabalhei na UNICAMP.
Em 1970 iniciei minha pós-graduação na Universidade do Texas (Austin), onde
obtive o doutorado em 1974. Fiz estágios pós-doutorais, uma vez no Texas e três
vezes na Univ. de Illinois (Urbana-Champaign). Depois de aposentado, trabalhei
na Univ. de Illinois como professor visitante (2 semestres) e na Univ. do
Mississípi (3 semestres); no Brasil trabalhei durante 4 anos e meio na
PUC-Minas, e desde 2008 estou de volta à UFMG como professor voluntário, com
uma bolsa do CNPq. Minhas pesquisas se concentraram em três pontos principais:
(a) gramática do português do Brasil, em especial sintaxe e semântica; (b)
ensino de português como língua estrangeira; e (c) aquisição da leitura
fluente. Publiquei 12 livros, além de um número especial de revista (com 3
colaboradoras) e uma antologia. Meu projeto atual é a descrição das valências
verbais do português do Brasil.
LM: Recentemente o senhor foi
homenageado com a Medalha Isidoro de Sevilha, concedida pelo Círculo Fluminense
de Estudos Filológicos e Linguísticos. Como foi esse momento e como se sente em
relação a esse reconhecimento da importância de trabalho para o país?
P: O que me agradou nesse episódio foi o
reconhecimento por parte de meus colegas (a Medalha é concedida mediante uma
votação entre os linguistas em atividade no Brasil). É muito bom saber que tem
gente competente que lê o meu trabalho e o aprova.
LM: Quais suas maiores realizações no
campo da pesquisa linguística? O que o levou a pensar numa “gramática do
português brasileiro”?
P: Acho que o mais importante é a contribuição que
tenho tentado dar à descrição do português brasileiro. Sempre achei muito
estranho que o português brasileiro, que é a língua nativa de 190 milhões de
pessoas (é no mínimo a 8ª língua mais falada do mundo), não tivesse sido objeto
de uma gramática – já que todas as gramáticas disponíveis descrevem o português
escrito, que é muito diferente. Tentei remediar essa situação com meu livro
Modern Portuguese (publicado pela Univ. de Yale em 2002) e agora com a
Gramática do Português Brasileiro (Parábola, 2010).
LM: O Senhor considera a Gramática uma
ciência? Por quê?
P: A gramática é certamente uma ciência – é parte da
linguística, e precisa ser estudada levando em conta os princípios de rigor
metodológico, coerência interna e adequação aos dados que regem o trabalho
científico em geral. A gramática tradicional utilizada em nossas escolas é
deficiente em todos esses pontos – além de ser normativa, isto é, muitas vezes,
em vez de descrever os fatos, dá prescrições sobre como os fatos deveriam ser.
LM:
Qual a perspectiva teórica adotada em sua obra mais recente, “Gramática do
Português Brasileiro”?
P: A GPB não segue nenhuma das correntes teóricas do momento. Em vez disso,
procurei fazer uma descrição dos fatos da língua, baseando-me em resultados já
aceitos por todos os linguistas (ou pela maioria). Se há na GPB algum
posicionamento teórico, seria o cognitivista, mas fortemente colorido por uma
preocupação de descrever fatos.
LM: Quais os seus objetivos em relação à
publicação? O senhor espera que ela seja adotada em todos os níveis de ensino?
P: A GPB foi escrita tendo em mente o público
universitário: alunos de faculdades e professores de português. Para os níveis
iniciais, vai ser necessário produzir novo material , inclusive exercícios, com
uma seleção cuidadosa de temas para se adequar ao nível de informação dos
alunos do ensino médio.
LM: Quais os maiores problemas com o ensino de
Língua Portuguesa nas escolas em geral, e nas escolas brasileiras, num sentido
mais estrito?
P: O maior problema é a deficiência de leitura e
escrita. Isso vai ter que ser atacado separadamente, e não tem a ver com o
ensino de gramática. Precisamos de boas bibliotecas nas escolas, muita ênfase
na leitura, produção de obras de divulgação científica e intelectual etc. O
ensino de gramática, embora importante, vem em segundo lugar. Eu não acredito
que estudar gramática seja um caminho para o desenvolvimento das habilidades de
leitura e escrita; a gramática tem seu lugar na escola média, mas como uma
disciplina científica, ao lado da química e da história.
LM: A partir do lançamento da gramática,
qual o seu próximo projeto? Continuará envolvido no estudo da gramática? Fale
de algumas perspectivas.
P: No momento, estou envolvido com meu projeto de
descrição das propriedades sintáticas e semânticas dos verbos do português
brasileiro – é o que eu chamo as valências dos verbos. E tenho a intenção de
voltar ao estudo da estrutura interna do sintagma nominal, um projeto dos anos
90 que só foi realizado em parte. Mas tenho também planos de produzir material
de ensino de gramática para uso na escola média.
Por
Artarxerxes Modesto
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